Fumo dos megaincêndios do Canadá pode atingir Portugal nos próximos dias

Uma nova vaga de megaincêndios no Canadá está a gerar fumo altamente tóxico que já atravessa o Atlântico. A pluma de partículas poderá afetar a atmosfera sobre Portugal nos próximos dias. Especialistas alertam para riscos na qualidade do ar, mesmo que o fenómeno passe despercebido.

Qualidade do ar incêndios do Canadá
Nova vaga de incêndios no Canadá pode afetar a qualidade do ar em Portugal nos próximos dias.

O Canadá está neste final de maio com uma nova vaga de incêndios florestais de proporções históricas, com dezenas de milhares de hectares já consumidos pelas chamas e mais de 17 mil pessoas evacuadas. Mas os efeitos destes megaincêndios já não se limitam ao território canadiano: massas de fumo altamente tóxico estão a atravessar o Atlântico Norte e podem afetar a atmosfera sobre a Península Ibérica, incluindo Portugal, nos próximos dias.

As previsões mais recentes de dispersão de partículas atmosféricas indicam que o fumo, transportado por correntes de altitude, poderá atingir os céus portugueses entre o final de sexta-feira e o início da próxima semana, especialmente nas regiões Norte e Centro. Ainda que as concentrações sejam mais diluídas, alerta-se para possíveis impactes na qualidade do ar, mesmo que o fenómeno possa passar despercebido.

Incêndios fora de controlo em Manitoba, Saskatchewan e Alberta

As províncias canadianas de Manitoba, Saskatchewan e Alberta enfrentam um período de incêndios que, apesar de estar apenas no início, já bate recordes. Só em Manitoba, o número de hectares ardidos este ano já triplica a média anual recente. Os incêndios mais graves – Bird River e Border – continuam fora de controlo, alimentados por temperaturas anormalmente elevadas, ventos fortes e vegetação extremamente seca.

Perante a dimensão da crise, os governos provinciais de Manitoba e Saskatchewan decretaram estados de emergência, numa operação logística que inclui a evacuação por via aérea de milhares de pessoas, muitas delas de comunidades indígenas isoladas.

A entidade governativa de Manitoba, Wab Kinew, descreveu a situação como “a maior evacuação de que há memória no território”, sublinhando que os incêndios afetam todas as regiões da província, algo inédito e indicativo das mudanças provocadas pelas alterações climáticas.

Também em Alberta, os fogos obrigaram à suspensão temporária de operações em áreas de exploração petrolífera, reforçando o impacto económico do desastre.

Fumo altamente tóxico atravessa continentes

A libertação massiva de fumo destes megaincêndios– muitos deles a gerar nuvens de pirocumulus, típicas de incêndios extremamente intensos – está a provocar uma vasta pluma de partículas finas (PM2.5), que já afeta seriamente a qualidade do ar em vários estados do centro-norte dos EUA, como Minnesota, Wisconsin e Illinois. Em cidades como Chicago, Detroit e até Washington DC estão lançados alertas vermelhos de qualidade do ar.

Mais preocupante ainda, este fumo está a atingir altitudes elevadas, entrando na circulação atmosférica de grande escala. Os satélites da NASA e do Copernicus Sentinel-5P detetaram que parte desta massa de poluentes já se dirige a leste, cruzando o oceano Atlântico. Segundo dados de ECMWF, é provável que uma fração dessas partículas chegue à Península Ibérica entre sábado e segunda-feira.

Monóxido de carbono e incêndios do Canadá e qualidade do ar em Portugal
O fumo dos incêndios do Canadá estão a atingir altitudes elevadas, entrando na circulação atmosférica de grande escala. Dados do ECMWF demonstram que pode afetar a qualidade do ar em Portugal Continental.

A sua chegada poderá coincidir com uma massa de ar quente e seco em altitude, aumentando a probabilidade de a pluma se manter visível na forma de um céu esbranquiçado ou amarelado, com entardeceres mais avermelhados do que o habitual. Ainda assim, os principais efeitos poderão ser sentidos ao nível da qualidade do ar, sobretudo para pessoas com doenças respiratórias, crianças e idosos.

Nenhum nível de exposição é considerado seguro

A toxicidade do fumo dos incêndios florestais tem vindo a ser amplamente estudada e os resultados são preocupantes. A exposição às partículas finas do fumo pode ter efeitos prolongados no coração e nos pulmões, mesmo meses após a exposição direta. Também são commumente apontadas as ligações com o aumento do risco de AVC, dificuldades cognitivas e interferência em tratamentos de fertilidade.

Ao contrário do smog urbano típico, o fumo de incêndios pode ser até dez vezes mais tóxico, dependendo da composição da vegetação e das estruturas ardidas. E não existe um “limite seguro” de exposição: mesmo concentrações moderadas podem causar danos, especialmente em pessoas vulneráveis.

Face a estes riscos, os especialistas recomendam o uso de máscaras N95 ao ar livre durante episódios de má qualidade do ar, bem como o uso de purificadores de ar em espaços fechados.

No entanto, em situações como a prevista para Portugal – em que as partículas se encontram em altitudes elevadas – os efeitos à superfície podem ser mais limitados, embora não inexistentes.

A intensificação dos incêndios no Canadá insere-se num padrão mais amplo de aumento da frequência, intensidade e duração dos fogos florestais, impulsionado pelas alterações climáticas.

A combinação de invernos mais curtos, primaveras precocemente quentes e verões prolongados está a criar um contexto propício a incêndios extremos em latitudes onde antes eram raros.

Com a época de incêndios de 2025 ainda no início, tudo indica que este poderá ser mais um ano recorde para o Canadá – e, potencialmente, para os seus impactes globais.

OSZAR »